As próximas semanas serão decisivas para usuários e provedores de Internet no país.
Tramita na Câmara dos Deputados desde agosto do ano passado o Projeto de Lei 2126/2011, que estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da Internet no Brasil – o novo Marco Civil da Internet.
Construído ao longo do primeiro semestre com ampla participação da sociedade brasileira, o Projeto entrará em regime de votação nas próximas duas semanas. Para reunir os subsídios necessários à redação do texto final, a Comissão Especial responsável pelo Projeto promoveu sete seminários em seis capitais do país, nos quais 63 representantes de 60 entidades e órgãos diferentes apresentaram suas contribuições.
Pontos de controvérsia
Ao longo das discussões, as divergências de interesse entre os diversos atores convidados a opinar giraram em torno de dois temas previstos na proposta de Marco Civil da Internet:
a) Responsabilidade civil de terceiros
Em termos gerais, a responsabilidade civil surge quando há um encontro entre ato infrator de direitos, danos derivados deste ato e comprovação de nexo causal entre aqueles elementos. No mundo da Internet, a ausência de legislação clara sobre a responsabilização por danos tem levado a Justiça a tomar decisões por vezes contraditórias.
Atualmente, os usuários têm sido responsabilizados na maioria dos casos. O PL 2126 isenta os provedores de responsabilidade pelos conteúdos de terceiros e, com isso, opôs dois grupos: artistas e acadêmicos a representantes de redes sociais e de detentoras de direitos de propriedade intelectual.
O primeiro grupo defende que os provedores sejam responsabilizados e que só possam remover conteúdos quando autorizados pela Justiça. O argumento é que o livre compartilhamento de dados precisa ser preservado de possíveis arbitrariedades pelos provedores. Por sua vez, o segundo grupo defende a versão atual do texto, argumentando que a desnecessidade de autorização judicial retira do sobrecarregado Poder Judiciário brasileiro mais um fardo.
Outro argumento utilizado é que, sendo responsabilizados pelo conteúdo gerado por terceiros, os provedores teriam que fiscalizar todo o conteúdo circulante, acabando com o direito do usuário à privacidade.
b) Neutralidade da rede
O princípio da “igualdade dos direitos” tem como representante, no mundo digital, o princípio da neutralidade da rede. Em outras palavras, os provadores devem evitar a prática do “traffic shaping”, ou seja, gerenciar os dados que trafegam pela Internet de maneira discriminatória. O caso mais comum de “traffic shaping” é a transmissão facilitada de pacotes de dados de parceiros comerciais dos provedores, lesando os demais usuários.
De outro, provedores de acesso fixo e móvel argumentam que, como o tráfego de dados está crescendo 53% ao ano frente a uma infra-estrutura praticamente estagnada, o Marco Civil deveria prever discriminações de tráfego que trouxessem benefícios, a exemplo do bloqueio de spams.
Os provedores argumentam ainda que praticar discriminações no tratamento dos dados é necessário por conta dos diferentes objetivos dos protocolos de Internet: enquanto uns têm a função de transmitir a informação de forma integral, mas lenta, outros devem transmitir os dados com velocidade, mas de forma estratificada.
---
Como se percebe, o texto final PL 2126/2011 a ser apresentado e votado deve-rá, grosso modo, apaziguar divergências importantes de interesse entre o chamado segundo setor (provedores, operadoras de Telecom) e o terceiro setor (acadêmicos, artistas – em alguns casos, escudados pelo governo federal). Aqueles defendendo isenções de responsabilidade e possibilidade de discriminação de dados; estes, maior regulação e isonomia na Internet.
Por sua complexidade e evidente importância, o assunto merece ser acompanhado de perto pela sociedade brasileira como um todo e, claro, pelo vasto Mundo Nerd de plantão!
Por Igor Vasconcelos
Assessor Técnico no Ministério das Comunicações